Cirurgias Mamárias
Nos dias atuais, salvo raras exceções, o tratamento cirúrgico ainda é mandatório em pacientes acometidas por câncer de mama. As cirurgias mamárias visam ressecar o tumor com margens livres, ou seja, o tecido ao redor da lesão não pode estar acometido pela doença.
Basicamente dividimos as cirurgias em radicais e conservadoras. No caso das radicais, a mastectomia e suas variações, consistem na retirada de todo o tecido glandular mamário, com ou sem preservação de pele e/ou pele, aréola e mamilo. Já a cirurgia conservadora, chamada de quadrantectomia, setorectomia ou ressecção segmentar, visa a retirada do tumor com margens livres e preservação do tecido mamário remanescente. De modo geral a cirurgia conservadora é seguida de radioterapia.
Não havendo contraindicações, as condições oncológicas permitindo e a paciente concordando, a cirurgia conservadora é o tratamento de escolha. Isso porque inúmeros estudos demonstram segurança oncológica e impacto positivo quando se preserva a mama – propiciando boa recuperação, maior aderência ao tratamento, satisfação pessoal e ganhos na autoestima, relacionamento e convívio social.
Em algumas situações durante a cirurgia conservadora teremos que lançar mão da reparação mamária (reconstrução parcial) com o próprio tecido mamário remanescente ou tecidos ao redor da mama (oncoplastia) para assegurar um bom resultado cosmético.
No caso das pacientes que são candidatas a mastectomias, sempre que possível deveremos realizar a reconstrução mamária imediata, pois além de trazer inúmeros benefícios para as pacientes em relação a qualidade de vida, não atrapalham o tratamento oncológico e tecnicamente são mais fáceis de serem realizadas se comparadas a reconstrução tardia.
Terapia Anti-Her-2
Her-2 é a abreviatura de "Human Epidermal growth factor Receptor-type 2", ou seja, receptor tipo 2 do fator de crescimento epidérmico humano. Em quantidades normais, esta proteína tem um papel importante no crescimento e desenvolvimento de uma vasta categoria de células. Quando esta proteína está com a expressão aumentada (super-expressão) consideramos este tumor como Her-2 positivo. Este tipo de doença é habitualmente bastante agressivo e até o desenvolvimento de novos medicamentos este tipo de câncer costumava ser o mais agressivo.
Alguns destes medicamentos já estão disponíveis no Brasil inclusive na rede pública. Dentre eles podemos citar:
Trastuzumabe (HerceptinR)
O Trastuzumabe foi o primeiro anticorpo monoclonal a ser utilizado no bloqueio da via Her-2 e seu uso modificou a história do dos tumores Her-2 positivos. Este medicamento é utilizado associado a quimioterapia em todos os cenários possíveis como na adjuvância (tratamento após a cirurgia), neoadjuvância (tratamento antes da cirurgia) ou mesmo no cenário em que a doença está metastática (em situações que a doença se espalhou para outros órgãos). Em todas estas situações o uso do trastuzumabe se mostrou um tratamento muito adequado.
Pertuzumabe (PerjetaR)
O Pertuzumabe também é um bloqueador do HER-2 porém se liga a um outro local e estudos comprovaram que o uso de Trastuzumabe associado a Pertuzumabe (também chamado de duplo bloqueio) e quimioterapia apresenta um resultado melhor tornando-se o tratamento preferencial na neoadjuvância e na doença metastática
T-DM1 (KadcylaR)
O T-DM1 (Trastuzumabe Entansina) é uma nova classe de medicamentos chamados de anticorpo droga conjugado. Esta medicação é reconhecidamente efetiva em pacientes com câncer de mama HER-2 positivas na doença metastática e também para alguns casos em que a doença não respondeu completamente a um tratamento de quimioterapia antes da cirurgia
TDxd (EnhertuR)
O Trastuzumabe Deruxtecan é uma nova droga recentemente aprovada para câncer de mama avançado HER-2 positivo e também para o grupo de pacientes com expressão menor de HER-2, conhecida como HER-2 “low” ou baixo.
Estes medicamentos mudaram tanto o tratamento como a chance de cura de pacientes com câncer de mama HER-2 positivo e atualmente inúmeros outros tratamentos estão sendo pesquisados.
Quimioterapia
O tratamento do câncer de mama compreende várias etapas, sendo elas cirurgia, quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia e outros tratamentos como terapia alvo e imunoterapia.
A quimioterapia é utilizada no tratamento do câncer de mama em três situações:
- De maneira neoadjuvante: Nesta situação, seja porque o tumor é muito agressivo ou muito grande, a indicação é o tratamento com quimioterapia antes de uma eventual cirurgia.
- De maneira adjuvante: A quimioterapia adjuvante é utilizada em pacientes que já operaram e o potencial risco de recidiva a longo prazo é considerado alto. A indicação aqui é a diminuição do risco da doença reaparecer (recidiva).
- De maneira paliativa ou remissiva: Caso haja uma recidiva da doença a quimioterapia paliativa pode ser indicada para controle dos sintomas e da doença objetivando também um aumento da sobrevida.
No câncer de mama os tratamentos com quimioterapia são habitualmente feitos com mais de um medicamento (drogas) e dependendo do tipo do tumor podem ainda ser associados outros medicamentos como terapia alvo ou imunoterapia. Estes tratamentos com quimioterapia agem destruindo as células malignas que formam o tumor ou se multiplicam desordenadamente. Estes medicamentos se misturam com o sangue e são levados a todas as partes do corpo, destruindo as células doentes e impedindo, também, que elas se espalhem pelo corpo. A principal função da quimioterapia é diminuir a quantidade de células malignas no organismo aumentando assim a chance de cura da doença.
Infelizmente a quimioterapia ainda não age apenas nas células malignas e alguns efeitos colaterais são possíveis e dependendo do tipo de quimioterapia são frequentes. Os principais efeitos colaterais são: queda de cabelo, diminuição da imunidade, anemia, diarreia, feridas na boca (mucosite), náuseas e vômitos, pele sensível e até mesmo infertilidade.
A maior parte dos medicamentos quimioterápicos são injetáveis, mas hoje temos a alguns que podem ser administrados por via oral. Nem todos os pacientes são elegíveis para o tratamento via oral.
O tratamento com quimioterapia para o câncer de mama é muitas vezes conhecido pela cor, assim alguns pacientes se referem ao tratamento com quimioterapia como
Quimioterapia “vermelha”que é formada por uma classe de medicamentos chamada antraciclinas, que apresentam tons avermelhados e é uma das drogas mais utilizadas no tratamento do câncer de mama.
Quimioterapia dita “branca” é formada por diversas classes de medicamentos que não apresentam nenhuma cor, como ciclofosfamida, taxanos, gencitabina e vinorelbina. Os taxanos também são muito utilizados no tratamento do câncer de mama.
É importante explicar que a cor do medicamento é devido às características físico-químicas dos seus componentes e não influencia nos efeitos colaterais.
O intervalo de administração da quimioterapia varia bastante podendo ser a desde a cada 21 dias, passando por protocolos a cada 14 dias e no câncer de mama podem inclusive ser semanais. Para pacientes que utilizam a quimioterapia oral o tratamento pode ser ainda diário. A maior parte dos tratamentos vão necessitar de um tempo de recuperação para uma nova administração que varia de acordo com o protocolo utilizado e os efeitos colaterais enfrentados pelo paciente.
Imunoterapia no câncer de mama
A imunoterapia é um tipo de tratamento que visa combater o avanço da das células malignas pela ativação do próprio sistema imunológico do paciente. A ideia é que, com o uso de medicamentos, o organismo do paciente elimine a doença de forma mais eficiente e com menos toxicidade. A imunoterapia também é conhecida no meio médico como inibidores de “checkpoint” imunológico e estes tratamentos têm causado uma revolução no tratamento de alguns tipos de cânceres de mama.
O sistema imune utiliza vários mecanismos complexos para identificar quais células são nossas e não devem ser “atacadas” e quais células são consideradas perigosas (conhecidas como “non-self”). As células tumorais apresentam vários mecanismos para conseguirem sobreviver e “burlar” nosso sistema imune e um deles é a produção de uma proteína conhecida como PD-1. Com a produção desta proteína em grande quantidade que acaba se ligando a uma outra proteína do sistema imune (PD-L1) o organismo acaba aceitando e que uma célula maligna sobreviva e tenha o potencial de se multiplicar.
Alguns medicamentos imunoterápicos que bloqueiam o PD-L1 ou o PD-1 foram testados e podem ser utilizados em conjunto com a quimioterapia no câncer de mama.
Atezolizumabe (TecentriqR)
O atezolizumabe é um anticorpo monoclonal de imunoglobulina G1 (IgG1) que se liga diretamente ao PD-L1 e bloqueia alguns receptores PD-1 e B7.1. Um estudo clínico de fase 3 (IMPASSION 130) identificou que pacientes com câncer de mama triplo negativos e que expressam PD-L1 têm benefício da utilização desta droga com quimioterapia.
Na neoadjuvância (tratamento antes da cirurgia) o estudo IMPASSION 031 utilizou a imunoterapia (atezolizumabe) com quimioterapia para pacientes com doença inicial triplo negativa e evidenciou uma melhora significativa as taxas de resposta patológica completa (desaparecimento do tumor após o tratamento) tanto para a população PD-L1 positiva quanto negativa.
Pembrolizumabe (Keytruda®)
O pembrolizumabe é um anticorpo monoclonal, antineoplásico, que bloqueia a via do PD1. Num e estudo clínico de fase 3 (Keynote-355) o grupo que recebeu o medicamento com quimioterapia apresentou melhor resposta especialmente para o grupo de PD-L1 com mais expressão. Este medicamento também foi estudado na neoadjuvância (tratamento antes da cirurgia) em estudo fase III associado a quimioterapia. A taxa de pacientes com resposta patológica completa (desaparecimento total do tumor) foi significativamente maior no grupo de pacientes que recebeu quimioterapia como também este grupo apresentou menos recidiva da doença.
Portanto, a imunoterapia pode ser utilizada de maneira complementar a tratamento do câncer de mama ajudando um grupo específico de pacientes (triplo negativos) a controlar melhor a doença. Muitos outros estudos estão em andamento e novos medicamentos devem ser incorporados ao tratamento padrão nos próximos anos.
Pesquisa clínica
A Pesquisa Clínica, Estudo Clínico ou Ensaio Clínico são pesquisas científicas que envolvem seres humanos e têm como objetivo avaliar a segurança e eficácia de um procedimento ou medicamento. Essa pesquisa visa à procura de alternativas a um procedimento seja ele diagnóstico ou mesmo um novo tratamento para uma determinada doença.
É importante dizer que as pesquisas em serem humanos passam por uma rigorosa avaliação antes de poderem acontecer e, portanto, qualquer pessoa que participe de um estudo clinico precisa estar de acordo e ciente dos potenciais riscos e benefícios da sua participação. Os estudos são aprovados por um comitê de ética médica que avalia se esta pesquisa pode eventualmente infringir alguma lei e se os potenciais benefícios superam os eventuais riscos do procedimento ou tratamento.
Antes de pesquisa clínica, habitualmente os medicamentos são testados numa fase dita pré-clínica sendo feita em laboratório (in vitro) e ou em cobaias (animais). Quando em fase clínica, o participante precisa ter ciência de todo o processo e só pode participar assinando o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) que explica detalhadamente tudo o que vai acontecer durante o estudo. Por este motivo o participante da pesquisa clínica não pode ser considerado uma cobaia, pois tem o completo discernimento e sua participação é voluntária.
A pesquisa clínica compreende algumas fases que acontecem de maneira sucessiva e apenas passam para a fase seguinte com o sucesso da fase anterior, são elas:
- Fase 1: É a primeira etapa depois da comprovação do tratamento ou procedimento em estudos pré-clinicos. Nesta fase, o medicamento é testado em pequenos grupos (de 20 a 100 pessoas) de voluntários sadios, ou ainda no caso da oncologia, em pacientes que o tratamento padrão já foi tentado e não há uma alternativa melhor. O objetivo principal aqui é a segurança e a definição da dose no caso de medicamentos.
- Fase 2: Os estudos de fase II são realizados em pacientes portadores de determinadas doenças, por exemplo o câncer de mama, e os principais objetivos são estabelecer a segurança a curto prazo, a dose-resposta e a eficácia do produto.
- Fase 3: Esta é a fase mais importante na aprovação de um medicamento ou procedimento. Aqui os testes vão fornecer todas as informações necessárias para a elaboração do rótulo e da bula do medicamento e a análise dos dados consegue comprovar a eficácia e a segurança do medicamento ou procedimento, e, com base nestes dados as autoridades sanitárias avaliam a aprovação para uso comercial.
- Fase 4: Os estudos de fase 4 são realizados após a aprovação regulamentar do medicamento ou procedimento e habitualmente são conduzidos para fornecer mais informações sobre quão bem o medicamento funciona e quão seguro ele é num grande número de pacientes.
A maior parte dos estudos clínicos são registrados em uma plataforma internacional que reúne informações importante para médicos, investigadores e possíveis pacientes, estes estão disponíveis no link: https://clinicaltrials.gov/.